
Ele não se lembrava de nada: não se lembrava do que havia comido ontem, não havia se lembrado também do que comeu hoje, e provavelmente não se lembrará do que vai comer amanhã. Sua miserável memória era tão gasta quando as botas que costumava calçar, sem se importar em molhar os pés nos dias de chuva. A geladeira era repleta de recados que iam de lembretes escritos em folhas de cadernos, até pequenos post-its escandalosamente coloridos. Seus atrasos em encontros familiares já não eram mais surpresa, e todos os primos, tias e avós haviam se acostumado com a cara de vergonha que ele fazia a cada jantar. Mas Charlie era esperto: sempre encontrava pelo caminho algum motivo para puxar assunto à mesa de jantar, naquelas tediosas reuniões de família.
Mesmo se existissem palavras para defini-lo, elas seriam invisíveis. Ao lado de Lola, cantava em todas as noites frias e sem dono à beira da janela do quarto, esquecendo-se do início de suas canções e quase sempre do refrão também: algum dó, ou um sol, ou um mi, era esquecido pelo caminho. Depositava com zelo e carinho Lola no colo, e ajeitava suas cordas (no qual tinha orgulho de denominá-las de cabelo) e hora e outra declarava seu amor por alguém que não existia; suas crises de rinite eram tão freqüentes que a presença do lenço vermelho no bolso de trás da calça tornou-se fundamental e até mesmo costumeira. Costumava sair cedo de casa, de barriga vazia com uma ou duas xícaras de café, e voltava ao entardecer, pois se esquecia quase sempre do caminho de volta para casa.
Achava Bob Dylan um grande mal educado: sempre desabafava seus problemas (na maioria das vezes inventados) e Dylan cantava e tocava, e nunca o escutava. Era o mesmo com a Janis, com o Johnny Cash, e todos eles eram sem educação em sua farta imaginação carente. Encheu-se tanto de falar, que apenas escutava, e aprendera, com isso, que todos eles o compreendiam. A partir daquele momento, as suas folhas ficaram com o cargo de psicólogos. Isso, quando não se esquecia dos problemas.
Mesmo se existissem palavras para defini-lo, elas seriam invisíveis. Ao lado de Lola, cantava em todas as noites frias e sem dono à beira da janela do quarto, esquecendo-se do início de suas canções e quase sempre do refrão também: algum dó, ou um sol, ou um mi, era esquecido pelo caminho. Depositava com zelo e carinho Lola no colo, e ajeitava suas cordas (no qual tinha orgulho de denominá-las de cabelo) e hora e outra declarava seu amor por alguém que não existia; suas crises de rinite eram tão freqüentes que a presença do lenço vermelho no bolso de trás da calça tornou-se fundamental e até mesmo costumeira. Costumava sair cedo de casa, de barriga vazia com uma ou duas xícaras de café, e voltava ao entardecer, pois se esquecia quase sempre do caminho de volta para casa.
Achava Bob Dylan um grande mal educado: sempre desabafava seus problemas (na maioria das vezes inventados) e Dylan cantava e tocava, e nunca o escutava. Era o mesmo com a Janis, com o Johnny Cash, e todos eles eram sem educação em sua farta imaginação carente. Encheu-se tanto de falar, que apenas escutava, e aprendera, com isso, que todos eles o compreendiam. A partir daquele momento, as suas folhas ficaram com o cargo de psicólogos. Isso, quando não se esquecia dos problemas.